24 fevereiro 2007

Perder a timidez


As mudanças já foram feitas há alguns meses, mas as arrumações, essas, parecem sempre não ter fim...

Ao arrumar umas malas, encontrei no interior de uma algumas folhas escrevinhadas. Uns "poemas", se é que lhes posso chamar isso. Uns "escritos" será talvez mais adequado.

Não rimam, nem seguem qualquer regra de composição métrica ou poética. Têm mais valor para mim do que alguma vez terão para quem os ler e não sei ao certo quando foram escritos, talvez 2002 ou 2003, durante as viagens de comboio para Lisboa. Até hoje nunca os mostrei a ninguém. Hoje resolvi deixar cair a timidez... (sim, estou a fazer graçola com o título) :)

Aqui vai:

"Timidamente"

Sento-me no comboio
No lugar vazio à tua frente
Timidamente
Observo o teu reflexo no vidro

Finges não me ver
E os teus olhos permanecem longe
Perto
Da linha do horizonte

O comboio estremece
Os motores aquecem
Eu estremeço
E o meu coração aquece

Timidamente
Transporto o meu olhar
Do reflexo no vidro
Para os teus olhos

O comboio parte
E os teus olhos permanecem com o horizonte
Voam sobre as árvores
Contornam as casas e flutuam sobre os vales
Nadam sobre o rio

Sinto ciúmes do vidro
Só tens olhos para ele
Timidamente
Movo-me no banco
E espero uma reacção
Nada
O vidro continua a possuir-te

Paramos
Cedo à derrota e levanto-me para me apear
Na gare não resisto
Timidamente
Olho pelo vidro
Os teus olhos seguem-me
E ofereces-me um sorriso

(2003?)

(Garfield e o reflexo, Dez 2006)